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  • Foto do escritorCristiane Oliveira

SÉRIE: CONHEÇA -Julio Casé - Livros, sonhos, descobertas e café

Morando ou não no Centro-Oeste brasileiro, todo mundo sabe, ou ao menos imagina, quão quente são essas bandas. Por isso, é muito mais convidativo chamar alguém para tomar uma “gelada” do que um cafezinho. Ainda assim, foi para um café que o meu confrade da Academia Sinopense de Ciências e Letras me convidou, depois de um telefonema para perguntar como faria para comprar um livro meu. Era o ano de 2018.

Pouco depois do telefonema, levei meu livro “Saga de Gigantes” para ele, o Dr. Júlio César Marques de Aquino, no Hospital Regional de Sinop, Mato Grosso, onde ele estava fazendo plantão. Enquanto me dirigia ao hospital, percebi que Júlio fizera uma transferência bancária com o valor do livro. Confesso que me senti lisonjeada, mas também um tanto curiosa... oras, um doutor fazendo tanta questão de adquirir um de meus livros, e pagando até adiantado?

Diante do meu agradecimento e curiosidade sobre os motivos que o levaram a ter tanto interesse em minha obra, Dr. Júlio apenas me respondeu: - Leni, agora estou de plantão e tenho pouco tempo para conversar. Mas gostaria de tomar um café contigo e lhe sanar a curiosidade sobre a compra de seu livro. Apenas lhe respondi que sim, que era só marcar, e segui meu caminho. 

Fiquei aguardando uns dois meses, e nada do Dr. ligar para marcar o café. Então eu tomei a iniciativa e, num final de tarde, conseguimos nos encontrar e conversar. E Dr. Júlio, membro da Academia Sinopense de Ciências e Letras, autor de inúmeros artigos científicos publicados, manifestou a mim o desejo de publicar um livro de pequenos contos que ele vinha escrevendo, com base em histórias de seus pacientes. Ele já tinha até lhe dado um nome: “Receitas para a vida”. 

Ao saber que eu já havia publicado mais de 15 livros, procurou-me com o intuito de que eu lhe apontasse o caminho, para que ele também pudesse publicar seu livro. Senti-me honrada por isso, e entre o café e os vários assuntos falados, apresentei ao meu confrade o caminho que ele buscava. E o Doutor, modéstia à parte, graças à minha ajuda, realizou em 2019 seu segundo maior sonho: publicar seu próprio livro. 

Talvez não tenha sido o ano mais merecedor de um livro publicado por um médico, com o título de “Receitas para a vida”, uma vez que foi o mesmo ano em que a humanidade registrou uma das maiores pandemias da história. Mas, como diria Chicó, do grande Suassuna: “Só sei que foi assim”. 

Júlio Casé, como o conhecemos na Academia Sinopense de Ciências e Letras, é Júlio César Marques de Aquino e, como já falei, entre um café e outro, houve muita conversa, com temas para muito além do livro. Escritores são curiosos por natureza, pois é a existência humana seu material de trabalho, e claro que não fujo à regra, e logo quis saber um pouco mais sobre a vida de meu confrade. 

Foi assim que eu soube que Júlio é filho de Reginaldo e Sandra, que se apaixonaram, casaram-se e formaram a sua família num contexto de baixo poder aquisitivo, levando-os a matricularem seus filhos em escola pública, isso tudo no Guarujá, no litoral de São Paulo. 

Entre seus filhos, estava o Casé, um garoto normal, que trabalhou desde muito cedo e ocupou muitas profissões diferentes, com o objetivo comum da maioria dos brasileiros: Melhorar de vida e poder proporcionar coisas boas à sua família. Mas o menino Casé já tinha planejado como faria tudo isso, pois o sonho de ser médico já se instaurara em sua cabeça juvenil. 

Todos sabem que a profissão medicina é vista como algo de elite em nosso país. Mas o que nem todos se dão conta é que a vida de um médico é extremamente ocupada e cheia de preocupações, e que o alto rendimento monetário tem o preço de se ter uma vida totalmente dedicada aos problemas dos outros. É uma profissão física e emocionalmente desgastante. Ainda assim, é o sonho de muitos brasileiros. Uns por status, outros por se identificarem com a profissão, por se apaixonarem pelo oficio. 

O Júlio César Marques de Aquino, filho de Reginaldo e Sandra, do Guarujá, comunidade Senhor Bom Jesus, cresceu se tornando uma pessoa apaixonada por ajudar o próximo, e viu na medicina um meio ideal para concretizar essa paixão, unindo assim o cuidado ao próximo com a perspectiva de poder melhorar sua vida. 

Júlio, afrodescendente, decidiu então entrar em um programa de estudos destinado a esse segmento, afrodescendentes, e ali demonstrou seu interesse em ajudar os demais, já que se prontificou a orientar os colegas novos que iam chegando e também aos que tinham dificuldade com as matérias estudadas. Logo, tornou-se professor. 

Já professor e sem desistir do sonho de ser médico, recebeu o convite para estudar medicina em Cuba. E lá se foi Casé, para seis longos anos longe dos amigos, da família, da vida social; em outra cultura, em outro regime político, tendo de se adaptar a um país completamente diferente do Brasil. A paixão pela medicina da família, para ajudar pessoas, era tão grande que Júlio só voltou para cá quando já havia se feito médico. 

Ao retornar, agora diplomado, teve de viver outra saga, dessa vez para validar seu diploma. Complementou os estudos, fez provas de proficiência, investiu recursos, lá foi Casé mais uma vez, buscar seu registro de médico, o tal CRM no Brasil. 

Apaixonado pela atenção primária, o Dr. Júlio decidiu dedicar-se à saúde da família, uma ação que contribui significativamente para desafogar os hospitais e pontos de atendimento. O atendimento básico no Brasil é feito pelo Sistema Único de Saúde, o SUS, nas Unidades Básicas de Saúde, as UPAs, e não diretamente na família. 

Assim, Júlio é um médico que dedica 80% de seu tempo atendendo no SUS e nas UPAs, e os outros 20% atendendo em seu consultório particular, que, cá entre nós, oferece preços bem diferenciados dos comumente praticados pelo mercado da medicina no Brasil. 

Contou-me ainda, entre mais alguns goles de café, que ele veio morar em Sinop por encontrar na cidade uma oportunidade de fazer residência médica e porque sua esposa, conhecida no curso de medicina, é mato-grossense. Os dois dedicam seu tempo ao cuidado com o próximo, à leitura, ao permanente estudo na área médica e à família. São caseiros, tranquilos, muito educados e dedicados em tudo que fazem. 

Praticante da fé católica, Júlio faz parte do movimento carismático, no qual ele participa tocando canções relacionadas à elevação espiritual e até gravou algumas músicas em parceria com colegas do movimento. 

Sai daquele café conhecendo um médico e um escritor, lisonjeada por poder ajudá-lo a concretizar seu sonho e enfim tendo minha curiosidade sanada. Doutor Júlio é um exemplo de dedicação, foco, fé e amor ao próximo.




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